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CIÊNCIA INVISÍVEL 

A nanotecnologia no cotidiano e os desafios da pesquisa nas universidades  

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Capítulo 1: Ciência invisível: a nanotecnologia está em sua casa, mas onde?

LARA CRISTINA, LORENA ROJE E PRISCILA FARIA


Era uma terça-feira. O sol já estava no topo do céu, fritando o asfalto e fazendo vapor subir. Meio dia, depois do almoço, e minha pasta de dente tinha acabado. É claro, o universitário pouco consegue se organizar, listas pregadas na geladeira e post-its pela casa com anotações de coisas para fazer ou comprar não são páreos para a desorganização do estudante. Lá fui eu no sol escaldante de verão, comprar a bendita pasta. 


Chegando na farmácia, as gotículas de suor se formando na minha testa, peço: quero de menta por favor. Me dirijo à fila, que por algum motivo está grande demais, e espero minha vez chegar. Nisso, sem nada pra me distrair, começo a ler os ingredientes do creme dental:
“Contém carbonato de cálcio, água, álcool etílico, bicarbonato de sódio, lauril sulfato de sódio, fluoreto de sódio, sorbitol, benzoato de sódio e glicerina. Além de manter seus dentes limpos e sua boca saudável, a maioria dos cremes dentais conta com um agente que ajuda muito na longevidade dos seus dentes. Trata-se de um nanocomposto de hidroxiapatita, uma camada de fosfato de cálcio cristalino que preenche as pequenas cavidades dos seus dentes e ajuda na prevenção das rachaduras que podem aparecer com tempo.” 


Li tudo que estava escrito, paguei no caixa e fui pra casa. Com os dente escovados, volto pra faculdade. 


Em determinado momento da aula, quando nenhum conteúdo prendia minha atenção, comecei a pesquisar aleatoriamente sobre coisas que eu havia observado naquele dia. Uma delas, claro, foi a pasta de dente e os ingredientes dela que eu tinham ficado na cabeça. O que havia de tão especial assim em ingredientes com nome esquisito? Nem eu sabia, até me deparar com dezenas de conteúdos sobre os ingredientes de creme dental e muitos outros que utilizavam de uma tecnologia um tanto quanto excêntrica, a nanotecnologia. 


Essa mesma ciência que muitos acreditam estar a anos luz da nossa compreensão, em um universo onde somos evoluídos demais e humanos seriam mandados para viver em colônias nos planetas humanamente habitáveis. Mas será que era tudo isso mesmo? Pesquisando, descobri muito mais, e desmistifiquei o senso comum da nanotecnologia como ciência futurística. A nanotecnologia está presente em nossas casas, em utensílios cotidianos como band-aids e pasta de dente. Está nas lojas de cosméticos. Está, até mesmo, em nosso corpo, nas roupas que vestimos, e nos nossos pés, nos sapatos que calçamos. 


Curiosamente, não foi somente eu que me encantei e aprofundei nesse universo da nanotecnologia, o professor universitário Antônio Carlos de Oliveira revela que, também, conheceu esse termo aleatoriamente enquanto estava na praia de férias com a família e foi atrás de roupas de banho, quando a vendedora informa que a roupa que ele havia adquirido continha uma tecnologia que protegia contra os raios ultravioletas, ali surge sua curiosidade sobre o assunto. Atualmente  Antônio vem fazendo uso de roupas com nano não só para idas na praia, mas também para prática de esportes como o ciclismo e spinning, “A roupa com nanotecnologia é confortável, são roupas de atletas, mergulhadores e corredores. A diferença é muito grande para uma roupa comum, absorve o suor, protege contra o calor e não atrapalha” afirma. 

As roupas com a tecnologia nano ainda são os produtos mais conhecidos sobre um tema pouco disseminado pelo país. Essas peças tem algumas características próprias, como a condução de eletricidade; facilitação do equilíbrio térmico (como mencionado pelo professor Antônio Carlos); bloqueador de  raios UVA  e UVB; fios bacteriostáticos (detém o crescimento de bactérias); tecidos que repelem líquidos e manchas. Pelo Instagram, rede social com 1 bilhão de usuários, vídeos com roupas impermeáveis são frequentemente viralizados.  
 


 

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Capítulo 2: Mas afinal de contas, o que é nanotecnologia?

Talvez essa pergunta não seja assim tão simples de ser respondida. Mas, tornando o complicado um pouco mais descomplicado, basicamente, a nanotecnologia é a manipulação da matéria ao nível molecular, e ela visa criar, assim, novos materiais, substância e produtos, com uma precisão atômica. Ou seja, essa tecnologia é responsável por criar coisas em escalas microscópicas, ou em nanoescala.


O termo nanotecnologia apareceu no mundo a pouco mais de 50 anos. Em 1959 o físico Richard Feynman dissertou sobre os conceitos na nano, ele já via as possibilidades de manipulação de átomos e moléculas, o que seria resultado em componentes com tamanhos impossíveis de serem vistos a olho nú (FEYNMAN, 1960). Quando se fala de nanotecnologia as pessoas associam o termo à pesquisa científica, isso porque o termo nanotecnologia significa nanociência. O termo nanotecnologia é mais utilizado por ser uma expressão comum.


Já na década de 1980,  devido a uma convergência de avanços experimentais, como a invenção do microscópio de varredura de tunelamento (trata-se de uma ferramenta para visualização de superfícies de nível atômico, ou seja, tudo a ver com a nanotecnologia), desde então houve um esclarecimento e popularização das pesquisas voltadas a esse assunto.


O nome de Eric Drexler, que é cientista, engenheiro e nanotecnologo estadunidense é sempre mencionado em pesquisas sobre o tema. Por ter sido o precursor com o livro “Engines of Creation” (em tradução literal, Motores da Criação). Embora o livro tenha uma narrativa de ficção científica, a obra é toda baseada em um grande trabalho desenvolvido por Drexler, que foi o primeiro cientista a doutorar-se em nanotecnologia pelo MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts). 


 

 

Mas pera aí! Esse assunto de nano isso, nano aquilo, que lembra fortemente a animação Arthur e os Minimoys, pode nos deixar confusos em relação a tamanhos. Afinal de contas, quão pequena é essa nanotecnologia? Cientificamente falando, a nanotecnologia envolve uma escala nanométrica, com esse incrível tamanho de 0,000000001 m ou 10-9m, ou seja, só um nanômetro equivale a uma parte bem minúscula de um metro (Tá, podemos parar de falar dos Minimoys porque eles são bem maiores que a realidade nanométrica). Ok, agora, aqui vai uma comparação: um fio de cabelo têm 105nm ou 100.000 nm, enquanto uma nanopartícula têm de 100nm a 200nm, ou seja, já deu pra ter uma idéia do tamanhinho da nanotecnologia né?

 

 

 

 

 

A nanotecnologia é uma ferramenta poderosa, isso porque na teoria ela seria responsável pelo aperfeiçoamento de produtos e melhora em meios de produção. Essa tecnologia é responsável por desenvolver materiais e componentes em áreas de pesquisa como: medicina, eletrônica, engenharia de materiais, etc.

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Capítulo 3: Campo de pesquisas

O investimento para pesquisas de nanotecnologia no Brasil foi tardio, começou no fim da década de 90, enquanto nos Estados Unidos estudos já eram realizados desde a década de 1960. Hoje em dia, o Brasil está entre os dez países que mais investe em pesquisas e patentes em fertilizantes à base de nanotecnologia, segundo o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior.

 

Porém esse investimento se restringe apenas em fertilizantes, visto que somos os maiores consumidores desse produto no mundo. Segundo o coordenador da Rede de Pesquisa em Nanotecnologia, Sociedade e Meio Ambiente, Paulo Martins, a área de estudos sobre os impactos ambientais é negligenciada no Brasil. Os estudos estão baseados em ciências de produção e não nos impactos que a nanotecnologia pode gerar ao meio ambiente, na sociedade e saúde do trabalhador. 


As universidades possuem um papel fundamental na área de pesquisa e desenvolvimento da nanotecnologia. Em 2013 foi o criado o Sistema Nacional de Laboratórios em Nanotecnologias SISNANO que reúne laboratórios direcionados ao desenvolvimento, educação e pesquisas em nanociências e nanotecnologias. Faculdades como Unicamp, UFRGS, UFMG, USP e Furg estão integradas no projeto europeu NanoReg que é responsável pela regulação internacional das pesquisas na área.
Hoje, a UFU possui dois laboratórios de pesquisas em nano, são eles: o Laboratório de Energia, Sistemas Térmicos e Nanotecnologia (LEST) e o NANOS que é a sede do Instituto Nacional de Nanobiotecnologia. Os dois realizam pesquisas distintas. O LEST é responsável por pesquisas de processos como: melhorias no funcionamento de um motor, refrigeração eficaz e de maneira mais rápida de produtos domésticos e o melhoramento em produtos já existentes. Já o NANOS é um núcleo de excelência financiado pela CAPES, CNPq e FAPEMIG, que conta com 10 Instituições Federais e 21 laboratórios e realiza pesquisas voltadas a nanobiotecnologia. 


O LEST é o único centro de pesquisas que usa a nanotecnologia experimental de engenharia, isso quer dizer que eles realizam processos que resultam em melhorias em alguns sistemas térmicos. O laboratório conseguiu um convênio com uma grande empresa  de automóveis, cujo objetivo é  aplicar a nanotecnologia no fluido de resfriamento automotivo. Os pesquisadores conseguiram diminuir o tamanho do radiador em cerca de 8% a 10%, todos os desenvolvimentos já foram feitos e está em fase de finalização para aplicação na indústria. 


O coordenador e orientador do laboratório, professor do curso de engenharia mecânica, Enio Pedone, ressalta uma das últimas aplicações que estão sendo desenvolvidas, os fluidos no motor. “É uma pesquisa de última tecnologia, está ligada a parte de óleo, onde você precisa dispersar pequenos fluidos (nanopartículas) no óleo. Com esse sistema é possível melhorar a transferência de calor e, também, o sistema de refrigeração. Inclusive é ele capaz de aumentar a vida útil desse conjunto, porque é um trabalho mais “folgado, digamos assim”.  


Pedone explica que existem  empresas de grande porte que foram e são parceiras do laboratório, como: Fiat, Petrobras, Emerson Refrigeração, Bitzer Compressores, Carel (empresa de tecnologia) e empresas que trabalham com fluidos refrigerantes. Na área da engenharia mecânica, eles são avaliados com nota de 7 de excelência, na CAPES.


Falar de nanotecnologia é falar de desenvolvimento e melhoramento. Ela está presente em diversas áreas e pode ser aplicada de diversas maneiras. Os processos e os estudos são fundamentais para o progresso científico de um país como o Brasil. Em todos os laboratórios, existem trabalhos sérios, que de alguma forma interferem direta ou indiretamente  na vida de cada pessoa.   

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Capítulo 4: Desafios da pesquisa com o corte de verbas

 

Em 30 de Abril o ministro da educação Abraham Weintraub anunciou um corte de 30% nas verbas a serem repassadas para a educação, a partir do próximo semestre. Com isso alguns laboratórios que dependem desses repasses sentirão impactos desses cortes. 

A pesquisa no Brasil já é um tema complicado. O investimento não é tão eficaz e várias pesquisas de suma importância são abandonadas, por falta de subsídio. Nem precisamos ressaltar o valor da nanotecnologia, as pesquisas são criadas com o intuito de melhorar um sistema que já existe. Por exemplo, o sistema de resfriamento de uma geladeira, com a ajuda da nanotecnologia, os pesquisadores desenvolvem um sistema mais eficaz e que gasta menos. Trazendo retornos positivos para quem usa os utensílios e diminuindo os efeitos ao meio ambiente.

Ainda não é possível sentir os efetivos impactos que são resultados dos cortes, dentro dos laboratórios. Os intercambistas Frank Blanco e Daniel Florez vieram da Colômbia e já conheciam a UFU  e a cidade de Uberlândia. Frank Blanco fez uma parte de sua graduação de Engenharia Mecânica na UFU e decidiu voltar fazendo mestrado. Os dois são bolsistas e acreditam que serão os últimos a receber a bolsa, que hoje é disponibilizada pelo CAPES.

 Questionamos Enio Pedone sobre os efeitos de cortes dentro do laboratório de pesquisa. Ele nos contou que primeiramente as verbas para as pesquisas foram retiradas, entretanto, o curso tem nota 7 pelo CAPES  e cursos com essa avaliação não sofrerão diretamente com o contingenciamento. O laboratório recebe, de 3 em 3 anos, uma verba no valor de R$ 500.000,00 e que esse valor é dividido para várias atividades que são realizadas.

Pedone ressalta que apesar do corte não ocorrer para o laboratório, os alunos sofrem com os reajustes de gastos. As pesquisas e o laboratório só funciona com os estudantes e se eles não têm apoio financeiro fica complicado seguir com as pesquisas. O valor que é recebido a cada 3 anos não engloba o pagamento das bolsas. 

O contingenciamento dos gastos, dentro das universidades, tem cara de retrocesso. O país pode passar por grandes desacelerações em diversas áreas. 

A expectativa é negativa quanto ao próximo semestre, que é quando os cortes serão aplicados, o campo da pesquisa irá sofrer vários impactos, e alguns laboratórios poderão até ser fechados pela falta de verba. 

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